Ana Filipa Almeida: "Vila Cova de Perrinho faz parte de todas a minhas memórias de infância"
Com apenas 23 anos de idade, confessa o carinho pela sua terra e pelas suas gentes. Conheça a história da Ana Filipa Almeida, um dos elementos da Direção do Rancho Folclórico "A Primavera" de Vila Cova de Perrinho. Nasceu a 23 de outubro de 2000, e desde os seus 14 anos faz parte do grupo, em julho de 2022 assumiu o cargo de Tesoureira da Direção do Rancho Folclórico "A Primavera" entre outras funções.
Ana Filipa, a tua terra, Vila Cova de Perrinho, é a terra onde nasceste, cresceste e onde passaste a tua infância, de certeza que guardas na tua memória várias memórias, dessas recordações. Qual é a melhor recordação que guardas da tua infância?
"Vila Cova de Perrinho faz parte de todas as minhas memórias de infância, de todas as minhas vivências, posso até dizer que faz parte dos melhores momentos da minha vida. Sou ainda muito jovem e na minha idade era espectável que tivesse uma infância ligada às novas tecnologias, às redes sociais, aos telemóveis, mas felizmente a minha terra trouxe-me uma visão diferente do viver e do conviver. A minha família esteve sempre ligada à agricultura e ao trabalho do campo, a minha infância foi sempre em casa dos meus avós, rodeada dos animais e a aprender que em tempo, a terra era o sustento dos meus avós. Lembro-me que nos dias mais chuvosos, a minha avó, levava-me juntamente com a minha prima para o palheiro para nos ensinar a enrestar cebolas e muitas das vezes saímos de lá com umas trancinhas no cabelo amarradas com uns farrapos. A nossa diversão era a terra e apesar de já ser comum a utilização da internet , nós gostávamos e preferíamos a casa dos avós, o contacto com a natureza, as tardes passadas no tanque onde a minha avó Jacinta lavava a roupa, sem grandes brinquedos, por vezes utilizávamos os objetos que tínhamos à mão, brincávamos com terra, com as flores, com mil e uma coisas que nos aparecia. Foi esta simplicidade que marcou a minha infância".
A família para ti tem um enorme significado? Qual é a melhor memória que tens em família?
"Para mim a família não se limita apenas aos pais, irmãos, tios, primos, avós, para mim, uma verdadeira família são aqueles que passam pelas nossas vidas e nos marcam, e marcam porque nos proporcionaram momentos felizes. Nem todos os elementos da família são capazes de nos proporcionar estes momentos, por vezes há amigos que não tem nenhum grau de parentesco connosco e acabam por nos ensinar e alegrar.
Lá em casa sempre houve alguém que nos ensinou, o meu avô Justiniano, que nos transmitiu excelentes valores, uma excelente educação e acima de tudo a importância da família, a importância de sermos justos, corretos e acima de tudo a importância de fazer o bem sem olhar a quem. Se há momentos em família que me marcaram, foram as férias passadas em casa dele, os passeios com a minha família, os natais cheios de gente, os almoços no tempo de lavoura, em que a minha avó acordava cedo, acendia o forno e fazia um belo de um assado, como mais ninguém sabe fazer. Tenho muitas saudades destas pequenas coisas, que em tempos foram completamente banais mas agora recordo com angústia porque sei que o tempo nunca mais vai voltar atrás e sei que nunca mais na minha vida vou viver os mesmos momentos".
A Primavera para ti também é uma família e sabemos que tens dedicado muito do teu tempo e da tua atenção a esta família que tem levado o nome de Vila Cova de Perrinho de norte a sul. Qual é a melhor memória que guardas da família Primavera?
"Recordar a "Primavera" é recordar a minha terra, Vila Cova de Perrinho. Tenho de louvar o empenho desta associação porque é algo inacreditável, algo que não é comum ver-se. Mais do que trabalhar pela "Primavera" trabalho pela minha terra. Recordo-me sempre deste grupo pelos melhores motivos, mas agora que estou na direção sinto que tenho de estar mais focada e empenhada, como era de esperar. Falando por todos, acho que o nosso principal objetivo é ver a alegria no rosto das nossas gentes, ver que Vila Cova de Perrinho não está esquecida atrás das montanhas, é ver a felicidade nos rostos de quem vive numa pequena aldeia que proporciona atividades não só para nós que vivemos aqui, mas para todos aqueles que nos visitam. As nossas atividades tem trazido muita gente a conhecer o que de bom se faz e se produz na nossa terra e isso é maravilhoso. É bom sentir que produzimos conteúdo que dinamiza a nossa terra, voltar a ouvir os cantares e os dançares pelas ruas é algo que não consigo descrever. Presamos sempre pela simplicidade e preferimos o convívio, algo que hoje em dia é raro. Não consigo exatificar um momento em concreto porque há milhares de momentos em que estamos juntos, a rir, a cantar, a dançar... são de facto momentos únicos que mais tarde quando os recordar, ficarei certamente feliz com o que vivi.
Ao longo destes dois anos e três meses na direção tens sido uma pessoa muito metódica, muito organizada. Como foi organizar a 2.ª Edição do Festival "Ao Largo" que decorreu no dia 5 e 6 de outubro. O que poderá ter corrido mal? Ou que pontos positivos houve neste fantástico festival?
"Existe sempre as aspetos a melhor em todas as atividades, essa é a nossa fonte de inspiração e incentivo para que possamos aprender e crescer, para que a cada ano possamos fazer mais e melhor. Na 1.ª edição, o São Pedro esteve do nosso lado, desta vez virou-nos as costas e de facto a meteorologia não esteve a nosso favor o que fez com que muitos dos nossos planos ficassem apenas no papel, uma vez que a sua concretização seria totalmente inviável. Apesar de tudo, tínhamos em mente uma representação fidedigna do passado e isso aconteceu. Respeitamos ao máximo as nossas tradições, mostramos como seria a vida em pleno século XIX. Não houve plástico, os utensílios eram de época, servimos apenas gastronomia típica. Podem crer que para o ano ainda será melhor e quero que dessa vez o São Pedro nos ajude".
O grupo vai a eleições já em 2025 para a eleição dos novos Órgãos Sociais, o Rancho Folclórico "A Primavera" vai contar com a tua recandidatura para o próximo triénio - 2025/2028?
"Em primeiro lugar tenho já a dizer que nunca pensei ser capaz de me interessar pelas nossas tradições, pela história dos nossos antepassados. Acho que até eu estou estupefacta comigo própria vendo aquilo que fui fazendo ao longo destes anos. Em tudo existe momentos altos e momentos baixos e é nesses que conseguimos perceber o quanto já fizemos, o quanto trabalhamos e o quanto evoluímos. Recandidatar-me para continuar e dar seguimento a tudo isto que já foi sendo feito, não depende apenas de mim. Para tudo continuar a equipa tem de se recandidatar toda novamente e também é necessário sentir que todo o grupo está com vontade de continuar e está disposto a suar a camisola. Isto é um trabalho duro, isto é puro amor à camisola, como se costuma dizer: fazemos por carolice. Tudo o que idealizamos e projetamos é feito graças às pessoas que fazem parte do grupo, claro que temos tido bastantes apoios de empresas e entidades mas a mão-de-obra é nossa, dos nossos homens que carregam, montam e das nossas mulheres que cozinham, dão do seu tempo. Isto é feito por amor, porque não há dinheiro que pague a preciosa ajuda de todos os elementos da "Primavera". De nada vale a minha recandidatura se o grupo não continuar motivado. De nada vale uma direção se não temos um grupo motivado, a direção simplesmente coordena e arruma a "casa", tudo o resto deve-se a todos os elementos do grupo. Só é viável a minha recandidatura se todos quiserem manter os objetivos".
Qual é o projeto ou objetivo que ainda está em falta? O que é que achas que ainda podem fazer em prol da vossa terra?
"Muito ainda está por ser feito em Vila Cova de Perrinho, infelizmente o poder autárquico não tem olhado para a nossa terra com olhos de ver. É necessário que promovam e desenvolvam atividades culturais e desportivas com qualidade e este trabalho não pode depender apenas da nossa associação. É necessário zelar pelas nossas ruas, pelas nossas infraestruturas públicas e nada disso tem sido feito. Há muitos anos que batalhamos com a autarquia para a manutenção e preservação do parque "Pisão dos Lagos", que está num estado degradável, além dele, temos o parque desportivo que está num estado surreal. Quem passa por lá percebe que é fundamental uma intervenção. É preciso melhorar o Centro Cívico, torná-lo uma verdadeira casa de espetáculos. Para além disso, Vila Cova de Perrinho tem património arqueológico que nem está devidamente identificado, que quase ninguém conhece. Foram feitos vários estudos que revelam vestígios do Neolítico no lugar do Rossio e é desconhecido pela maioria dos valecambrenses. A somar a tudo isto ainda temos o envelhecimento da nossa aldeia, é necessário fornecer-lhes apoio, atenção, dedicação, para que tenham um envelhecimento de qualidade.
Vila Cova de Perrinho tem de se mexer ou então acabará esquecida no tempo."
Imagina que hoje tens 95 anos e é o teu último dia na "Primavera", que mensagem davas aos teus companheiros do grupo e o que lhes desejarias para o futuro?
"Não é porque uma andorinha morreu que acabou a Primavera".
Uma entrevista a Ana Filipa Ferreira de Almeida
Edição: Ricardo Almeida
Fotos: Maria João Paiva